quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

AQUI NÃO TEM RIO


As palavras proferidas por uma menininha vítima do desastre carioca nos remetem a profundas considerações, ela declarou: “Aqui não tem Rio”. Podemos interpretar que no local seguro em que se encontrava estava longe do dilúvio que acometeu a região serrana carioca e dizimou famílias inteiras, mas nossa imaginação nos permite ir mais longe, nós aqui no Sul do país não temos o Rio com todas as suas magnitudes e encantos geográficos que ao mesmo tempo acompanham a dicotomia de suas desgraças sociais que alternam um comportamento festivo e alegre com um de extrema violência convivendo agora com outro de prostração diante da ação da natureza inclemente pela falta de planejamento e pela incapacidade funcional do poder público em responder rapidamente ao desespero coletivo. A sociedade brasileira está mergulhada num caudaloso rio de contradições, do ponto de vista ambiental, saneamento básico precarizado, planejamento urbano caótico resultado da falta de políticas públicas com relação à moradia digna para a população carente, a periferização é um fenômeno social comum na atualidade, as cidades modernas expulsam de seus centros de consumo aqueles que desfavorecidos economicamente e apesar de ser maioria são alijados dos espaços privilegiados. O mar de lama em que afundamos enquanto habitantes desta terra mãe gentil confunde-nos quando enfrentamos a resposta perversa a tanto descaso e agressão. Realmente aqui não tem rio, o que temos é um imenso deserto existencial, no passado mudamos o curso e produzimos este quadro pobre que sobrevive da espetacularização da desgraça alheia, da sensibilidade e solidariedade de muitos e da inescrupulosa monstruosidade de outros tantos que se arvoram sobre doações e bens daqueles que irremediavelmente flagelados pouco podem resistir. Esta na hora de nos definirmos como sociedade e assumir o papel de protagonistas deste cenário que a despeito de ainda vigoroso do ponto de vista natural se afunda desgraçadamente do ponto de vista social. Políticos e políticas mal intencionadas sufocam o bem, milhares manietados e manipulados pela luta da sobrevivência, convivem com alguns já desesperados resistentes que levam a vida de denunciar esta ordem comprometida com o lucro e a intolerância, até quando? É preciso acordar...

Texto: André Soares
Fotografia: Patrick Farrel

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