domingo, 3 de julho de 2011

UMA CANÇÃO


Chove na tarde fria de Porto Alegre, quando Vitor escreveu esta frase com certeza tinha a noção exata do significado de estar aqui no tempo e no espaço do paralelo 30, além de proporcionar uma reflexão mais profunda que a boa música nos oferta, neste frio intenso nos recolhemos ao bucólico clima que nos transporta pelos labirintos que insistentemente construímos em nosso conturbado cotidiano, sim afirmo sofrermos os maniqueísmos da contemporaneidade, não só do ponto de vista climático, mas também existencial.
Não quero passar a imagem de um indivíduo inexoravelmente pessimista, sem sombra de dúvida a arte me conforta e estimula, mas mesmo imbuído dos mais altruístas dos sentimentos por vezes caio na melancolia e como mecanismo de proteção busco refugio no frio, ele é o culpado, claro que quando está frio...
Também poderia enumerar uma extensa listagem de dissabores que afligem nossa sensibilidade, mas sinceramente só queria chamar a atenção de que muitos são os fatores que alteram o comportamento de um indivíduo na dura jornada de percorrer um dia, existir no limite de vinte e quatro horas, sobreviver.
Diariamente acordamos para a nova jornada, curiosos pelos acontecimentos das ultimas horas, na modernidade a vida não para, muitos grupos sociais com diferentes padrões de convívio em relação ao tempo, há os seres da noite, os trabalhadores do dia, os viciados sem dias ou noites, os doentes, os dementes e até os incoerentes que almejam seu lugar ao sol, as metáforas me socorrem, Van Morrison lança aos ares sua visão de vivermos exilados e que nunca retornaremos ao nosso local de origem, quem sabe???
Neste caudal no qual literalmente me sinto acorrentado, neste momento faz muito frio lá fora, aqui me aqueço nos meus subterfúgios tanto físicos quanto imaginários e ataco, quero atingir vigorosamente a imobilidade onde quer que se manifeste, ou por incapacidade ou por má vontade, a toda e qualquer forma de omissão, agora neste exato momento alguém passa frio e fome alguém sofre, alguém é agredido então o sentido de humanidade vai além de conceitos de políticas e se materializa em ação.
Você tem fome de que? sede de que?
Recorrente busco a música do Vitor Ramil e olho o cotidiano, sei que vou embora, nunca mais, nunca mais... chega em ondas a música da cidade... também eu me transformo numa canção, ares de milonga vão e me carregam.
Por aí, por aí...

Texto: André Soares

Foto: James Natchwey

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