sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Um Supermercado na Califórnia


Como estive pensando em você esta noite, Walt Whitman,
enquanto caminhava pelas ruas sob as árvores, com dor de cabeça, autoconsciente, olhando a lua cheia.

No meu cansaço faminto, fazendo o Shopping das imagens, entrei no supermercado das frutas de néon sonhando com
tuas enumerações!

Que pêssegos e que penumbras! Famílias inteiras fazendo
suas compras a noite! Corredores cheios de maridos! Esposas
entre os abacates, bebês nos tomates! - e você, Garcia Lorca,
o que fazia lá, no meio das melancias?

Eu o vi WW, s/ filhos, velho vagabundo solitário, remexendo nas carnes do refrigerador e lançando olhares
para os garotos da mercearia.

Ouvi-o fazer perguntas a cada um deles; Quem matou as
costeletas de porco? Qual o preço das bananas?


Será você meu Anjo?

Caminhei entre as brilhantes pilhas de latarias, seguindo-o
e sendo seguido na minha imaginação pelo detetive da loja.
Perambulamos juntos pelos amplos corredores com nosso
passo solitário, provando alcachofras, pegando cada um dos petiscos gelados e nunca passando pelo caixa.

Aonde vamos, WW? As portas fecharão em uma
hora. Para quais caminhos aponta tua barba esta noite?

(Toco teu livro e sonho com nossa odisséia no supermercado e sinto-me absurdo)


Caminharemos a noite toda por solitárias ruas? As árvores

somam sombras as sombras, luzes apagam-se nas casas, ficaremos ambos sós.

Vaguearemos sonhando com a América perdida do amor,
passando pelos automóveis azuis nas vias expressas, voltando
para nosso silencioso chalé?

Ah, pai querido, barba grisalha, velho e solitário professor de coragem, qual América era a sua quando Caronte
parou de impelir sua balsa e Você na margem nevoenta,
olhando a barca desaparecer nas negras águas do Letes?


Poema: Allen Ginsberg

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